Mariana Padrón* é uma jornalista venezuelana que vive em Nova York com visto de trabalho. Ela ainda aguarda a aprovação de sua autorização permanente de residência com a entrega do seu green card, e é por isso que a proibição de imigração anunciada no início deste mês pelo presidente Donald Trump — que proíbe a entrada de cidadãos de 12 países e limita os vistos a outros sete — lhe causou surpresa e preocupação.
"Decidi tomar precauções extremas. Ou seja, não viajar, não me expor, não usar nada, porque ainda sou venezuelana", disse Padrón à LatAm Journalism Review (LJR). "Meu maior medo é sair e não conseguir voltar. Minhas coisas estão aqui. Tenho um apartamento alugado, tenho meus amigos, minha comunidade..."
Essa disposição limitou Padrón não apenas pessoalmente, mas também profissionalmente. Seu trabalho como jornalista inclui viagens para fora dos Estados Unidos para cobrir ou participar de eventos. "Meu caso não é dos mais graves, mas mostra como, não importa quão bem você esteja fazendo as coisas [legalmente], todos nós estamos sendo afetados", disse ela.
A situação de Padrón reflete como as recentes políticas de imigração do governo Trump estão afetando jornalistas estrangeiros que viajam para ou a partir dos Estados Unidos. Embora não esteja diretamente proibida, seu medo de deixar o país e não poder retornar é uma evidência de como as novas restrições — justificadas por argumentos de segurança nacional — estão limitando o trabalho e a mobilidade da imprensa internacional, em um clima marcado pela incerteza e pela discricionariedade das autoridades migratórias.
O recente decreto de Trump, presidente dos EUA, justifica a medida — que proíbe ou restringe a entrada nos Estados Unidos de cidadãos de 19 países, incluindo Cuba, Haiti e Venezuela — como uma ação de segurança diante dos "riscos significativos" representados pela entrada de estrangeiros no país sem "verificação adequada".
Também se alega que cidadãos de alguns países podem representar riscos consideráveis de permanência além do prazo de seus vistos, aumentando a pressão sobre os sistemas migratórios e de aplicação da lei nos Estados Unidos.
“A Venezuela não possui uma autoridade central competente ou cooperativa para a emissão de passaportes ou documentos civis e carece de medidas adequadas de verificação e triagem”, afirma o decreto. “A Venezuela historicamente se recusou a aceitar de volta seus cidadãos. De acordo com o Relatório de Estadia Excedente da Venezuela, a taxa de permanência além do prazo para vistos B-1/B-2 foi de 9,83%”.
Cuba, assim como a Venezuela, está sujeita a restrições parciais. Entre as razões alegadas pelos Estados Unidos estão a condição de Estado patrocinador do terrorismo, a falta de cooperação com as autoridades americanas e a recusa em repatriar seus cidadãos.
No caso do Haiti, a entrada de seus cidadãos está completamente suspensa, tanto para imigrantes quanto para não imigrantes. A ordem executiva alega que centenas de milhares de haitianos entraram ilegalmente nos Estados Unidos durante o governo do ex-presidente Joe Biden, e a taxa de permanência com visto vencido variou entre 25% e 31%.
A medida, em vigor desde 9 de junho, prevê exceções para residentes permanentes legais, indivíduos com vistos válidos, certas categorias específicas de visto e aqueles cuja entrada seja considerada benéfica aos interesses dos Estados Unidos.
No entanto, o advogado de imigração Roberto Sarmiento disse à LJR que a entrada nos Estados Unidos ficará a critério do agente de imigração de plantão.
“O poder discricionário do agente desempenha um papel muito importante, e é aí que essa medida nos prejudica”, disse Sarmiento. “Temos que ficar à mercê de alguém que pode ser racista, que pode não conhecer a lei, ou que pode nem saber que tipo de visto está sendo apresentado”.
O secretário de Estado americano, Marco Rubio (Foto: Gage Skidmore/Flickr)
Em março, mais de 300 vistos de estudantes foram revogados sem justificativa clara, como parte de uma campanha de deportação em massa. A esse respeito, o senador Marco Rubio afirmou: “O visto é um privilégio, não um direito” – direito esse reservado apenas para aqueles que, segundo ele, tornam os Estados Unidos melhores e não irão “destruir o país por dentro”.
Sarmiento disse que também correm risco aqueles que viajam com o visto I — que permite que jornalistas estrangeiros entrem nos EUA para cobrir eventos jornalísticos ou produzir reportagens para públicos estrangeiros. O direito à residência permanente é a única opção segura atualmente, afirmou.
“Não há problema, desde que tenham passado por todo o processo de residência, obviamente tenham cumprido os requisitos de certificação e patrocínio por meio da sua profissão ou da empresa jornalística onde trabalham”, disse Sarmiento.
Jornalistas de outros países não abrangidos pela proibição também estão sujeitos às preferências das autoridades americanas ao entrarem nos Estados Unidos.
Em maio, o jornalista chileno Nicolás Sepúlveda tinha viagem marcada aos Estados Unidos para participar de uma cerimônia em que receberia o Prêmio Lasa Media, concedido pela Associação de Estudos Latino-Americanos. No entanto, dias antes de sua partida, seu status de isenção de visto foi alterado para "não autorizado", sem explicações.
Meios de comunicação que noticiaram o caso especularam que alguma publicação do jornalista nas redes sociais poderia ter influenciado a decisão, possivelmente relacionada à situação em Gaza. No entanto, Sepúlveda afirmou ter compartilhado apenas conteúdo jornalístico de agências de notícias.
"Sei que lá eles fazem muito alarde sobre ser uma democracia que funciona sob os parâmetros de uma democracia liberal, mas se estão restringindo a entrada em seu país por causa do que as pessoas escrevem em suas redes sociais ou outras plataformas, isso é típico de governos autoritários e não democráticos", disse Sepúlveda à LJR.
Muitos jornalistas também foram afetados por outras políticas de imigração e de viagens anunciadas por Trump: programas como o Status de Proteção Temporária (TPS) para cidadãos de países como a Venezuela foram eliminados; o uso do mecanismo de parole humanitário para cidadãos de Cuba, Haiti, Nicarágua e Venezuela foi suspenso; e canais de solicitação de asilo na fronteira entre os Estados Unidos e o México fecharam.
O Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ) publicou em abril um guia de recomendações para profissionais da imprensa que planejam viajar para os Estados Unidos.
De acordo com o documento, jornalistas devem se antecipar a possíveis restrições, confiscos e inspeções de dispositivos eletrônicos, ou interrogatórios ao viajar de ou para os Estados Unidos.
“Se houver a possibilidade de você ser afetado pelo aumento do escrutínio na fronteira dos EUA, considere se a viagem é essencial ou se a cobertura pode ser feita remotamente”, orienta o CPJ.
Sarmiento disse que, nos últimos anos, tem recebido um número crescente de jornalistas latino-americanos que veem os Estados Unidos como uma opção para escapar da violência e de regimes autoritários na região, sem deixar de exercer sua profissão. Para ele, a tendência é preocupante, considerando que a liberdade de expressão é um direito humano.
“Estou preocupado. Os jornalistas não sabem se devem usar ponto e vírgula ou ponto final ao escrever, porque não sabem quem vão ofender”, disse Sarmiento. “Antes, a mídia era a boa, a objetiva, a responsável. Agora parece que todo mundo se ofende.”
(*) A jornalista pediu para não usar seu nome verdadeiro por medo de que isso pudesse afetar seu processo de solicitação de residência.